Carpe Noctem

Sirva-se do rubro licor que em nossas veias corre...
Se bem vindo ao profundo de minha alma!

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

A garota que não podia chorar


Era uma vez uma garota muito bela e amável, tudo na vida dela era um perfeito teatro, uma ópera. Tudo era cronômetrado e bem ensaiado. Ela ia à escola, tirava notas altas, tinha um bom emprego, aprendia coisas sobre o mundo e a vida todos os dias... A noite ia para casa, jantar com os pais como em uma família perfeita...
Só havia um porém, a garota poderia estar cercada de amigos (como sempre estava), ter mil e um mimos a sua disposição, mas ela sempre estava sozinha. Não externamente, mas sozinha.
Então, ela cansou de ser sozinha e resolveu criar um mundo de faz de conta, onde ela teria tudo o que quisesse, onde seria tudo o que quisesse na hora que quisesse. Ela conseguiu, criou cada detalhe com a máxima precisão, tudo desde as folhas das árvores até as pessoas com quem convivia. Porém, como tudo na vida, o mundinho dela tomava um pouco da sua realidade e acabou se tornando somente mais um mundo vazio e sem sentido. Então ela resolveu mudar de personagem, ser outra pessoa. E assim ela fez. Mudou quantas vezes foi preciso, quantas vezes ela quis. Sempre que algo se tornava solitário de mais ela o abandonava e criava um novo. Assim ela criou seu universo pessoal e se trancou dentro dele.
Muitos anos se passaram e a garota, já vivendo em seu mundo muito tempo, resolveu dividi-lo com as outras pessoas. Ela começou a escrever sobre aquilo que havia criado. As pessoas que liam, de repente tornavam-se parte do mundo imaginário dela, e passavam a viver nele também. Agora o mundo que antes era um refúgio havia ficado lotado de pessoas, que mesmo ali ainda deixavam que a garota se sentisse solitária. O mundo seguro havia se tornado uma arma que a matava cada vez mais.
Ela tentou recomeçar e não conseguiu as pessoas que agora viviam lá não a deixaram mudar tudo.
Assim ela perdeu novamente. Agora era solitária no próprio mundo. “Há coisa mais triste do que isso?” se perguntou a garota.
Ela descobriu que sim quando as pessoas que haviam tomado seu mundo começaram a sugar a vida dela como parasitas para alimentar seus sonhos no mundo novo, quando todos começaram a castigá-la e usá-la para viver suas vidas e deixar a dela de lado. Mas ela se importava de mais com esse mundo para abandonar aquelas pessoas, e as alimentou até que suas forças se esgotassem.
Quando a energia acabou, quando a vida deixou seus olhos a garota em um último suspiro olhou para o céu e perguntou: “Por que?”
A única resposta que ela obteve foi um trovão seguido de uma melodia triste da qual somente a garota pode entender a letra:

“Você escolheu isso,
Você deu seu mundo a eles,
Agora é seu fardo morrer por eles...
Você não tem direito de chorar,
Você queria isso...
Queria que as pessoas te conhecessem
Agora entende: Certas pessoas não foram feitas para lutar,
Foram feitas para carregar a dor,
A tristeza e a mágoa do mundo.
Você se sentia só eu eu lhe dei o mundo.
Eu Lhe dei o mundo
Só a você.
Você queria satisfazer a todos,
Então agora entenda:
Somente o sangue satisfaz,
Somente a dor cura,
Somente a morte aquieta."